terça-feira, 24 de março de 2009

Declínio...Parte III

Cai por cima de um amontoado disforme de armaduras, escudos e espadas. Uma dor lacinante percorreu meu corpo em conseqüência da queda, estava tonto com o impacto, mas não havia me ferido. Quando olhei ao redor, tudo estava do mesmo jeito de quando pulei do navio em direção a batalha. Bors permanecia encurralado por guerreiros furiosos que atacavam de todas as direções. Meu salto havia sido muito mais longo do que eu havia previsto, cai sobre um grupo que ainda se aproximava pela lateral do navio. Três dos soldados já não levantavam mais, outros dois cambaleavam a procura das armas caídas, enquanto eu me erguia e pensava no próximo movimento. Bors não tinha mais tempo, estava exausto e seus movimentos já não eram mais tão velozes.
- Rus! – berrei como um louco o grito de guerra bárbaro. Corri para cima dos soldados que cercavam meu mestre sem nem ao menos saber como atacá-los. Agora eu já não tinha mais opção, só me restava brandir a espada e desferir golpes rápidos e curtos. Foi assim que tive minha primeira batalha. Fui de encontro ao inimigo, corria como um louco na direção dos soldados que atacavam Bors, todos atacavam ao mesmo tempo, e todos estavam de costas, se eu conseguisse alcançá-los sem que me notassem, poderia desviar a atenção para que Bors pudesse se salvar. Continuei correndo, o primeiro soldado estava bem a minha frente, ele desferia golpes violentos com uma lança e seria o alvo perfeito pra o meu ataque. O homem atacava sem técnica alguma, erguia a lança acima da cabeça e baixava com força contra Bors que se esquivava ou obstruía o ataque com o pedaço de lança que ainda segurava. O bárbaro com a lateral do tronco sangrando se protegia de joelhos enquanto uma dúzia de homens apostava quem seria o bastardo a dar o último golpe. Já quase não havia mais claridade na praia. A batalha agora era travada apenas com fúria e habilidade. O vento vinha forte do oceano, uma leve chuva começava a levar aos poucos o sangue seco preso em corpos mortos espalhados pela areia. O frio tomava conta e eu nem sequer notava, a única coisa de que me lembro agora, foi de minha espada entrando firme por entre a fenda da armadura do guerreiro. O homem largou a lança no mesmo instante e caiu de joelhos, puxei forte a espada para que se livrasse da carne do soldado e terminei com o sofrimento do homem com uma passada curta pela garganta descoberta pelo elmo. Quando o soldado caiu, parecia que todos os olhos se voltavam para mim. Ao que parecia, aquele homem era um dos nobres do exército inimigo, eu o havia matado, minha primeira vítima, um nobre que havia sido morto pelas costas, e agora eu contemplava dezenas de olhos que pareciam entrar em mim como flechas. Olhei para o lado e Bors partia o pescoço de mais um soldado. O que eu deveria parecer para os homens que me olhavam? Um garoto, sem armadura, sem escudo, e com uma espada que com certeza não havia sido feita para ele. Eles continuavam me olhando e eu pensava quanto tempo mais iria levar para que me atacassem. Quando um dos homens levantou o elmo para falar, senti uma brisa forte percorrendo minha espinha e a sombra de um machado que se erguia às minhas costas, rolei para o lado ao tempo em que a lamina pesada da arma se chocava contra a areia, o soldado lutou para erguer novamente com agilidade o machado , mas a arma era pesada demais, e aquela foi minha chance, chutei o elmo do soldado que desprendeu e saltou, chutei novamente com força e vi o osso do nariz sendo partido. O homem largou o machado, sacou uma pequena faca do cinto e se levantou contra mim. Tudo parecia calmo a minha volta, aquilo era uma sensação estranha e nunca ninguém havia me falado sobre ela. A batalha era desesperadora, uma infinidade de inimigos a minha volta e mesmo assim tudo era sereno. Os movimentos aconteciam com uma lentidão espantosa, meu raciocínio parecia acelerar e o homem com a faca avançava como um lobo. Novamente rolei para o lado no momento em que o soldado pulou, e dessa vez eu não o chutei, quando o homem caiu, eu já estava de pé, esperando para que ele olhasse em meus olhos antes de receber o último golpe. Cravei fundo a espada no crânio do inimigo e larguei a arma que ficara presa no crânio rachado.

O júbilo de se derrotar um inimigo em batalha não pode ser descrito em palavras. Aquela havia sido minha segunda vítima, meu primeiro combate e eu percebia que poderia matar centenas. A batalha ao meu redor não representava nada, só queria matar todos aqueles que ameaçavam Bors. Deixei o homem caído com a espada ainda presa ao crânio e peguei uma nova arma caída na areia.
Olhei para o navio e vi que Bors não estava mais lá. Muitos ainda lutavam na praia entre corpos prateados e cavalos estendidos, mas nem sinal do gigante. Agora já se tornava quase impossível para mim enxergar muito da luta que era travada na praia, com a espada não mão , corri pela areia para ajudar meus irmãos, meu sangue estava quente, eu me sentia estranho, era a loucura da guerra que tomava conta e controlava meus instintos. Seis guerreiros com armadura lutavam contra dois dos bárbaros de Aelle, Bors estava entre eles e pude notar que ao lado estava Onir que havia perdido um braço e agora brandia a espada com fúria. Parti em direção aos dois quando um homem pequeno e magro parou a minha frente segurando uma clava com pontas cobertas de sangue.

- Um garoto! – ria ele enquanto sacudia a arma – vou matá-lo e levar seu corpo aos cachorros!

O primeiro ataque do homem me mostrou o quão despreparado eu estava para enfrentar um combate frente a frente. O soldado manejava a arma de uma forma
rápida e eu mal podia acompanhar seus movimentos, ele atacava brincando comigo enquanto eu me esquivava da maneira que podia. Um golpe pesado veio de cima e me fez cair sem jeito na areia para evitá-lo, mais ataques vinham de cima, de baixo e pelos lados enquanto eu rolava de um lado para o outro pela areia. O homem gargalhava enquanto atacava e quando ergueu a clava para desferir o golpe que provavelmente arrancaria minha cabeça, atirei uma pedra que acertou a testa do homem. O soldado cambaleou e eu tive tempo de me levantar, teria apenas uma chance de atacar, levantei a pesada espada para baixá-la com força contra o crânio do homem e de repente tudo escureceu, senti uma dor gélida na cabeça e percebi que estava sangrando. Meu corpo
despencou na areia e pude abrir os olhos somente para ver um homem de armadura que sorria e segurava um elmo sujo de sangue. O guerreiro sacou lentamente uma faca do cinto e então a dor venceu a minha vontade de encarar a morte de frente. Meus olhos se fecharam e eu fazia força para abri-los novamente. Morreria antes de me tornar um verdadeiro guerreiro, morreria antes que pudesse ver Aelle mais uma vez. Por mais um segundo abri os olhos e vi meu assassino largando a faca enquanto seu corpo era suspenso pelo pescoço por um gigante negro coberto de sangue. Não pude ver mais nada.

Desmaiei e soube que talvez pudesse realizar meus sonhos, eu viveria porque Bors havia me salvado.

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